“Um bom rapaz”, de Javier Gutiérrez

30/01/2016 2455 visualizações

Por Vanessa Oliveira

 

Lançado em 2014 pela Verus, Um bom rapaz, do espanhol  Javier Gutiérrez, é daqueles romances que prendem do começo ao fim.  Gutiérrez é um dos integrantes da nova geração de autores espanhóis mais prestigiados pelo grande público: ganhador do Prêmio Opera Prima Nuevos Narradores (2004), do concurso de contos José Saramago (2008), do Prêmio Salvador García Aguilar (2009) e finalista do Prêmio Tiflos (2010). Num enredo  de suspense que trata de sentimentos à flor da pele, Polo e Blanca se reencontram 10 anos após um episódio de violência enterrado sob quantidades massivas de drogas e álcool. A verdade revelada se mostra  perturbadora e dolorosa.

Com o tempo a gente esquece das caras, você diz a si mesmo. Dos nomes, das razões. A gente se esquece dos motivos.”

No livro somos convidados a imergir na cabeça de Rubén Polo ex-integrante de uma banda de rock do final dos anos 90. A banda, formada por ele e mais 3 amigos, teve um fim abrupto com a morte de um deles. Drogas e álcool fizeram com que o caso fosse nebuloso, mas Polo nunca superou o ocorrido. 10 anos depois, ele reencontra Blanca, outra integrante da antiga banda. Assim, de uma hora para a outra, no meio de uma tarde de inverno, toda a  história volta à tona.

Javier Gutiérrez constrói uma narrativa intensa e carregada de toda a gama de emoções possível. Um bom rapaz nos proporciona a experiência de conhecer uma mente perturbada por um trauma e seus pensamentos, dúvidas e tormentas mais profundas. Usando múltiplas conversas cruzadas, o espanhol  constrói uma trama que se encaixa perfeitamente, mesmo com toda a sua complexidade.

Ao mesmo tempo brutal e lírico, Um bom rapaz se revela uma demonstração incomum de ambição literária, assim como uma leitura hipnótica e profundamente perturbadora. É uma história crua e fascinante, na qual o autor se vale de uma voz intimista e de um ritmo narrativo intenso que fisga desde a primeira linha, mostrando um dos abismos mais obscuros do ser humano: a culpa e o desejo.

Não tenho certeza como saber exatamente onde tudo começou, quando, por quê, naquela época não só eu, todos estávamos perdidos, aconteceu da noite para o dia, não fui capaz de ver a coisa vindo, de repente você abre uma porta, acende a luz e ali está o mal.”